‘Homens só avançam se elas abrirem as pernas’, diz professor no jornal Diário do Povo
Em uma crônica no jornal Diário do Povo desta sexta-feira (25/01), o professor José Maria Vasconcelos gerou uma verdadeira polêmica nas redes sociais. O texto ‘O pudor da mulher atrai o respeito do homem’ causou revolta em muitas mulheres, como se elas fossem culpadas por casos de assédio, como no trecho que cita: ‘Homens, comumente, só avançam se elas abrirem as pernas’.
Internautas manifestaram repúdio, inclusive o Departamento Estadual de Proteção à Mulher. Confira na íntegra a crônica:
O pudor da mulher atrai o respeito do homem
Toda sexta-feira, marco ponto na praça de alimentação do Teresina Shopping, frente ao Magia de Minas. O tempo passa, amigos vão se assentando. A mesa é cognominada de CONTEMPLATÓRIO. Belas mulheres desfilam, destilando colírio nos olhos masculinos devido à ousadia nos trajes.
Parece que as mulheres, especialmente mais jovens, perderam a noção de pudor, mais preocupadas com a violência masculina. Desconhecem uma característica natural do macho: a contemplação da beleza feminina. Falo do olhar fascinante, da leveza do papo. Não das saliências e entradas sem bater li porta da cordialidade e da prudência.
Homens, em geral, não avançam na mulher pudorosa, reservada e decentemente ajuizada, que não expõe a sua intimidade emocional e física. Em outras palavras, a mulher ideal não precisa exibir as nádegas para seduzir o homem. Nem expor, imprudentemente, sua intimidade emocional. Homens usam bermudas que escondem as nádegas e coxas. Transmitem muito mais pudor que as mulheres de fios dentais, shortes cavados expondo protuberâncias vaginais. Além dos decotes cobrindo apenas os mamilos. Fechem delegacias da mulher, providenciem condutas de pudor feminino, vergonhas mais escondidas.
Homens, comumente, só avançam se elas abrirem as pernas. “Por trás de um homem existe sempre uma grande mulher”. Saliente? Exibida? Sensual? Despudorada? Gentil e fácil para convites a motéis? O pudor não se resume apenas em sexualidade, porém na tendência inata, especialmente na mulher, de zelar por tudo que lhe pertence na intimidade, corpo e espírito, defendendo-a de qualquer intromissão inoportuna. O pudor esconde-se no mistério e encanta o homem. O mistério do pudor incendeia a testosterona e libido masculina. Em passado remoto, mulheres se vestiam do pescoço aos pés. Bastava um braço nu, a moçada se esquentava, a ponto de se refrigerar nos banheiros ou lençóis úmidos. Reinava velha filosofia do quanto mais difícil, mais saboroso. Madurões recordam-se das tertúlias, salões iluminados, canções românticas, namoradinha colada ao pescoço, doce esfrega sem avanços, de escapar leve líquido lubrificante… Hoje, tadinhos, dançam soltos, pulando, suados, exaustos, sem lesão. Mulheres preferem o calor afetuoso de suas amigas.
Homens, em vez de exibirem a cordialidade, adotam a violência. Ao tornar-se público, aquilo que é íntimo perde todo o seu valor. Acho que as mulheres devem voltar às origens de sua decência. Os homens, coitados, deixam de admirá-las, porque elas não valorizam o pudor. Explica-se o desaparecimento das revistas e sessões eróticas. A TV Globo mandou cobrir as dançarinas do Faustão. Não mais exibe o nu das garotas do Fantástico, nem a globeleza, nua, vestida de tinta. Talvez, em breve, eu volte ao shopping, apenas para deslumbrar-me com as cores dos vestidos, e não com as silhuetas dos bumbuns e coxas femininas. Elas precisam recuperar o pudor.
José Maria Vasconcelos, cronista, [email protected]
Uma das mulheres que se manifestaram no Facebook foi a jornalista Natacha Maranhão. “Eu não ia ler porque o título me incomodou. Mas li. E o sentimento é um só: NOJO! #Feminismo pra quê, né? Quem também não admite esse tipo de babaquice pode dar uma força aqui, ó: http://euconcordo.com/peticao/2124/repudio2501/”, disse.
Vale lembrar que o jornal pertence ao publicitário Fábio Sérvio (PSL), que foi candidato ao Governo do Piauí na última eleição. Também não é a primeira vez que profissionais do impresso, que esteve prestes a fechar as portas, se envolvem em polêmicas. Em 2017, o jornalista Mauro Veras postou no Facebook desdenhando de uma vítima de estupro. A menina de 11 anos era violentada desde os oito e Mauro disse que ela ‘gostava e queria’.
Após a repercussão do caso, o professor José Maria excluiu a postagem nas redes socais e no Facebook pediu perdão:
Departamento Estadual de Proteção à Mulher divulgou repúdio contra a crônica do professor professor José Maria Vasconcelos:
NOTA DE REPÚDIO
O Departamento Estadual de Proteção à Mulher do Piauí vêm a público repudiar o artigo publicado no jornal impresso “Diário do Povo” de hoje, dia 25/01/2019, intitulado “O pudor da mulher atrai o respeito do homem”, em tempo que solicitamos a respectiva retratação por parte do autor do artigo, José Maria Vasconcelos, pelas declarações demasiadamente sexista, intolerantes e preconceituosas veiculadas na edição supramencionada.
Dado que o texto apresenta a performance de um discurso de ódio que fomenta ainda mais a violência em nosso Estado que é permeado de casos com práticas diárias de violência contra a mulher que muitas vezes culminam em feminicídio.
E, um discurso como tal, que se pauta nessas bases repercute de forma danosa à população, fortificando velhos paradigmas sociais que deveriam ser desconstruídos.
A idealização de uma mulher sublime, perfeita e a exigência de que ela se adeque a determinados padrões físicos e comportamentais são resquícios do famigerado machismo que robustece a violência de gênero tão odiosamente combatida pelas sociedade civil e instituições formalmente constituídas.
Apesar dos inúmeros avanços, principalmente no que tange aos alcances legislativos de proteção a mulher e nas políticas públicas desenvolvidas com o escopo de tanger a violência, é lamentável nos deparamos com um conteúdo de uma matéria veiculada em um meio de comunicação, portanto formador de opiniões, eivado de conservadorismo e preconceito, incompatível com o mundo tão desenvolvido no qual nos inserimos e queremos fortalecer.
O machismo naturalmente pode ser identificado como uma violência contra a mulher, pois se destaca pela diferenciação extrema dos direitos e deveres entre homens e mulheres, arrebatando ao preconceito e à violência mais latentes, golpeando a liberdade feminina de se expressar e se portar de forma livre e sem ser importunada, sem riscos ou comprometimento em face de sua integridade física, moral, psicológica, sem risco a sua VIDA.
Tais discursos não podem mais serem aceitos e encarados como “naturais”, pois maximizam as diferenças e exuberam a violência travestida no ódio. E, nós, como mulheres e detentoras de prerrogativas dadas pelo Estado Democrático de Direito continuaremos vigilantes, além de buscar consolidar e robustecer as políticas públicas de enfrentamento à violência contra mulher em nosso Estado.
ANAMELKA ALBUQUERQUE CADENA
DIRETORA DO DEPARTAMENTO ESTADUAL DE PROTEÇÃO À MULHER
Fonte: 180graus