Piauiense denuncia no The Intercept a exploração de meninas em “casas de família”
A jornalista piauiense Nayara Felizardo publicou na quinta-feira (10), no site The Intercept Brasil, reportagem-denúncia sobre a exploração da mão de obra infantil no país, sobretudo no Nordeste, onde ainda é comum meninas entre 7 e 17 anos serem arrancadas do convívio familiar no interior e trazidas, a contragosto, para as capitais para “morar em casa de família”. A necessidade – até a fome – as transforma em “escravas”, sem direito a escola, lazer, … coisa nenhuma, exceto abuso, humilhação e taca.
Em pleno século XXI – e apesar da vigência de um punhado de leis e estatutos de “proteção” -, crianças e adolescentes continuam trabalhando como babás, empregadas domésticas, em troca de casa e comida. E mais nada!
Muitas dessas “empregadas” se tornam vítimas do assédio, sistematicamente abusadas, estupradas pelos patrões – ou pelos filhos, sobrinhos, parentes do “dono da casa”. Violadas na sua intimidade, algumas acabam apanhando da patroa enciumada, traída, acusadas de “pouca vergonha”. Além da violência física e psicológica, muitas meninas acabam devolvidas “embuchadas” para as famílias. E voltam a sofrer humilhação, agora dos pais, pelo crime do qual foram vítimas. E acabam fazendo a vida em bodéis, depoiis de expulsas por ter “se perdido”.
Selecionamos trechos do texto, muito esclarecedor, de Nayara Felizardo:
“Desde os 7 anos de idade, eu e meu irmão mais novo ajudávamos nosso pai na lida com o gado. No tempo da seca, no interior de Pernambuco, a gente andava cerca de 10 km para levar os animais da roça até o único lugar onde tinha água para eles beberem”. Esse poderia ser mais um texto sobre “eu também trabalhei quando era criança e isso não me atrapalhou em nada”, mas existe uma diferença muito grande entre ajudar os pais e ser explorado por um patrão. Essa é a realidade cruel do trabalho infantil doméstico que gente como o presidente Bolsonaro, a apresentadora Leda Nagle e a deputada Bia Kicis desconhecem, ou pelos menos fingem desconhecer, ao falar sobre suas felizes experiências laborais na infância.
Nossas histórias são muito diferentes da história da Ana*, uma jovem que começou a trabalhar aos quatro anos de idade em uma fazenda no interior do Piauí. Entregue pelos pais para outra família, ela cuidava dos animais, plantava e vendia legumes. Também era agredida constantemente. Aos 14 anos decidiu fugir, mas continuou a ser explorada – desta vez em uma casa em um bairro nobre da capital, Teresina. “Eu aceitei ir porque ela me prometeu que eu seria tratada como filha, ia estudar e que não precisava trabalhar. Era tudo mentira”, me contou Ana*, hoje com 19 anos. Falei com ela ontem, por telefone, após ler o seu processo, que corre na justiça do Piauí.
Entre 2013 e 2018, no segundo trabalho, a menina lavava, passava, cozinhava, fazia faxina e ainda era babá de uma criança com necessidades especiais. Vez ou outra trazia hematomas pelo corpo, provocados pelas agressões que sofria da patroa. Com tudo isso, teve que abandonar os estudos. Do salário de R$ 500 que lhe foi prometido, Ana recebia apenas uma parte. A patroa descontava valores altos da venda de roupas usadas e perfumes. “Ela nunca me tratou como filha.”
Leia a íntegra da reportagem de Nayara Felizardo AQUI.
Fonte: The Intercept Brasil